Os Fidalgos da Casa Mourisca - Cap. 20: XX Pág. 259 / 519

Não dei dinheiro sem garantias, nem também o dei com usura. Nenhum de nós aceitou favor do outro. Então qual é a razão dos escrúpulos de V. Ex.ª?

- Vejo que está mais informado dos negócios de minha casa do que eu próprio. Pode ser que eu devesse há mais tempo fazer o que fiz. A culpa é da minha ignorância. Quando porém tão pública foi a confissão da nossa baixeza, a minha dignidade obrigava-me a proceder como procedi.

- A dignidade... a dignidade... perdoe-me o fidalgo, mas se quer que lhe fale a verdade, eu já não sei bem o que seja dignidade, quando vejo o que por aí se faz à conta dela. Dignidade acho eu que a tem tido seu filho, trabalhando como um homem de bem para desempenhar a sua casa, e confessando diante de todos os seus actos, que não o envergonham; dignidade teve ele, quando defendeu uma pobre rapariga das calúnias de uns miseráveis, que também se dizem fidalgos, e que também falam muito na sua dignidade.

- Creio que é melhor não discutirmos. Os nossos princípios são diversos, não podemos entender-nos.

- Não há tal. Os nossos princípios, aqueles que me levam a falar, são os mesmos, são os de qualquer homem de bem. E eu prezo-me de o ser e V. Ex.ª também o é. Havemos de entender-nos por força. Nisto até o homem e Deus se entendem, não é muito que V. Ex.ª, por mais fidalgo que seja, se entenda comigo.

- Mas que quer afinal? Não terei eu a liberdade de deixar a minha casa quando entender que me convém fazê-lo? Não serei o mais competente juiz das minhas acções?

- V. Ex.ª saiu de sua casa, declarando a todos por que era que o fazia; e já aí o meu nome e a minha pessoa andaram envolvidos. Depois foi afligir a minha pobre Berta, que nada sabe destas coisas, obrigando-a a aceitar as chaves da Casa Mourisca





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