Os Fidalgos da Casa Mourisca - Cap. 24: XXIV Pág. 335 / 519

tido rara habilidade de deixar a humilhação por o único expediente ao meu pundonor! Colocaram a razão e a justiça da parte dos meus inimigos, forçoso era, para poder ter a cabeça erguida, curvá-la primeiro e implorar perdão.

Gabriela fingiu não atender à primeira parte das reflexões do tio.

- Muito bem. Vou falar ao Maurício. Tudo se há-de decidir em pouco tempo. Tenha fé em que se não perde uma família cujos futuros representantes têm um, o carácter honrado e a razão clara de Jorge, outro, os bons instintos e as brilhantes qualidades de Maurício. Pelo contrário, creio que ela está destinada a dar um salutar exemplo àqueles cuja estrela também declina, ensinando-lhe a única maneira de continuar, nos tempos que correm, as nobres tradições dos seus antepassados.

- E qual é essa maneira única? - interrogou o fidalgo, quase irónico, como se já esperasse a resposta.

- Entrar nobremente no caminho da actividade e do trabalho; distinguir-se aí, como se distinguiram outrora nas guerras de África e nas navegações os que tinham o mesmo nome para enobrecer. Ser ocioso, por não poder ser guerreiro, é fraco título para veneração dos contemporâneos. Cada século tem a sua tarefa, meu tio; a de hoje não se cumpre às lançadas nem às cutiladas. O bom senso do tio Luís há-de dar-me razão. Sabe além disso muito bem o que se faz lá por fora, o que se faz na Inglaterra, por exemplo, onde também há nobreza e orgulhos nobiliárquicos, como por cá, e mais talvez ainda.

- Bem vê que não desprezei a educação de meus filhos, nem impedi que Jorge trabalhasse, quando me pediu para o fazer. Pelo contrário, nesse dia julguei receber uma lição daquela criança, e cheguei a corar dos meus setenta anos de incúria e de ociosidade. A minha velhice achou-se menos veneranda do que aquela juventude.





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