Os Fidalgos da Casa Mourisca - Cap. 3: III Pág. 38 / 519

Põe-no ao ar para ele se não estragar; tudo quer ar neste mundo.» E aí me animei eu, ao princípio com medo, que fui perdendo depois, a dar emprego às minhas economias, e era um gosto ver como elas aumentavam. Passados anos eram tais, que já eu pensava em comprar umas terras, que era cá o meu sonho. Foi ele ainda que me tirou isso da cabeça. «Não tenhas pressa de ser proprietário, pregava-me ele, olha que os lucros que vais ter, gastando todo o teu dinheiro em comprar qualquer leira de terra, não correspondem ao gostinho de te chamares dono dela. Não te afogues em pouca água. Se comprares um cavalo e ficares sem cinco réis para o sustento dele, vê lá que negociarrão; pois as terras também comem, e tu bem o deves saber.» E o caso é que me convenceu e nem pensei mais nisso.

- Mas afinal sempre comprou?

- Quando ele mesmo mo disse. Foi à praça esta granja, que não era ainda o que é hoje. «Vê agora se ficas com aquilo», disse-me o Sr. doutor. A propriedade era de valor e eu não queria empregar na compra todo o meu capital. O Sr. doutor ajudou-me mais uma vez, e a propriedade passou para as minhas mãos. Então trabalhei mais do que nunca. Todo o meu empenho era remir depressa a minha dívida, porque, enquanto o não fizesse, parecia-me que não podia chamar ainda meu a isto. Deus ajudou-me com anos felizes e com boas colheitas, e como continuava com o arrendamento das Barrocas e depois com este negócio de gado, pude, mais cedo do que esperava, pagar a minha última prestação e remir a dívida.

Chegando a este ponto da sua narrativa, animou-se a fisionomia de Tomé da Póvoa de um clarão de entusiasmo, e com as faces coradas e os olhos radiantes prosseguiu, suspirando com desafogo:

- Que dia aquele, Sr. Jorge! Eu nem lhe sei dizer o





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