Clemente, que julgava compreender o enleio crescente e as palavras hesitantes de Berta, interrompeu-a dizendo:
- Já? disse que já não podia? Já? Berta teria acaso alguma inclinação a que o meu pedido viesse causar mal?
Berta, corando, replicou firmemente:
- Havia no meu coração um outro afecto, havia, o primeiro e único dessa natureza que nele tinha de nascer; mas não lhe causou mal o seu pedido, Clemente. Esse afecto, de que me não envergonho, nasceu, mas não podia viver. Era preciso sufocá-lo. Opunham-se-lhe tantos obstáculos, que não podia haver futuro para ele. Era como uma árvore de grandes raízes que nascesse em um vaso apertado. Nunca eu mesma me iludi com ele. Esta era a confissão que devia e queria fazer-lhe, Clemente. Julguei que poderia, sem indignidade, aceitar a sua proposta, dado que lhe falasse lealmente, como lhe estou falando; desde que lhe dissesse: não há amor no meu coração para lhe oferecer, não o podia haver; estimo-o como um homem honrado e aceito para mim o destino de lhe servir de companheira na vida. É a missão de uma mulher, e eu tenho coragem de cumprir no mundo a minha missão. Amizade leal, respeito, dedicação posso prometer-lhe, mais não, que não tenho para dar.
- Mas... - balbuciou Clemente, que não podia disfarçar a sua perturbação - mas esse homem existe?
Berta corou instantaneamente ao ouvir a pergunta.
- Existe - respondeu, porém, sem hesitar - e ama-me. Mas ele também sente, como eu, a necessidade de vencer este afecto. E há-de vencê-lo ou pelo menos ocultá-lo no coração, porque é forte. A consciência do dever ajudar-nos-á a ambos a vencer esta loucura. Bem vê que lhe chamo loucura. Mas deixe-me dizer-lhe, Clemente, se, depois da confissão que lhe fiz, se abriu no seu espírito uma entrada para a desconfiança, peço-lhe por piedade que desista da sua proposta, enquanto é tempo.