Jorge assustado com aquela impassibilidade, pegou-lhe na mão que tinha estendida por fora da roupa, como para procurar nela o calor da vida.
Ao contacto da mão do filho, o fidalgo estremeceu e abriu os olhos; vendo Jorge, passou-lhe nos lábios um desvanecido sorriso de afecto.
- Ah! és tu, Jorge? - disse ele com a voz ainda fraca - não te tinha visto entrar.
Frei Januário ficou estupefacto, ouvindo falar o doente, que ele já supunha em estado de não poder fazê-lo.
- Acha-se melhor? - perguntou Jorge, vergando-se sobre o leito.
O velho só respondeu encolhendo os ombros, como exprimindo indiferença pela sua sorte, e depois, fitando outra vez os olhos no filho, interrogou-o por sua vez:
- E tu?
Jorge estranhou esta solicitude no pai, tão fora dos seus hábitos, e sentia-se comovido.
- Eu?... eu estou bom.
- Estás pálido e doente - prosseguiu o pai, fitando-o.
E, sem desviar os olhos, recaiu no silêncio, que manteve por alguns segundos.
Depois, procurando a mão do filho e apertando-a na sua, murmurou com uma comoção a que só ultimamente era sujeito:
- És um homem, Jorge! És digno do nome que tens e da família que representas.
Estas palavras surpreenderam extraordinariamente Jorge e não menos Frei Januário que as atribuiu ao delírio produzido pela doença.
D. Luís acrescentou no mesmo tom:
- Saber sacrificar tudo a um dever é a principal e a mais difícil ciência que nós temos a aprender na vida, e tu... mostras que estás bem senhor dela.
Julgando perceber o sentido destas palavras, Jorge fitou no pai um olhar perscrutador.
Ele porém fechou novamente os olhos e por muito tempo permaneceu como caído em um sono profundo.
O filho e o padre conservaram-se ao lado do leito.
- Como vão os negócios da nossa casa? - perguntou daí a pouco ele sem abrir os olhos.