Os Fidalgos da Casa Mourisca - Cap. 14: XIV Pág. 164 / 519

Esta é que é a verdade; mas daqui a realizar o tipo de Lovelace ou D. Juan Tenório, incumbindo a ela a parte de Clarisse ou de Elvira, vai muita distância. Estas coisas, se tu não andasses tão alheado dos negócios terrenos, devias saber que são de prática comum em qualquer parte onde se encontra uma rapariga bonita e um rapaz que se preza de saber apreciar o belo. Ora agora vê lá se há motivo para o terror trágico que te infundiram.

- Não é terror trágico, é desgosto. Eu bem sei que são usuais esses galanteios que dizes, essas falsas ostentações de amor, com as quais se profana e desprestigia tudo quanto há de mais santo e respeitável no coração do homem. Às vezes sucede, é verdade, que uma das partes interessadas, talvez por andar alheada dos negócios terrenos, como dizes, entra com alma nessas comédias sociais, e, quando a cena finda, muito a bel-prazer do outro actor e sob os aplausos dos espectadores que riem, essa alma sente-se ferida de um golpe mortal. As ilusões da mocidade, o suave perfume de um afecto virginal, as primícias de um amor casto, tudo se desvanece nestas profanações, e não sei que haja espírito tão leviano que ouse tentar a representação destas comédias ridículas e ao mesmo tempo perversas com uma pessoa a quem se devem afeições leais e respeitos.

- Mas...

- Em uma palavra, Berta é a filha de um homem honrado; Berta era a amiga e a companheira de Beatriz e muitas vezes se sentou connosco à mesa, a que presidia nossa mãe, que a abençoava quando nos abençoava a nós. Não te lembras disso?

- Lembro, e por isso mesmo a amo. Não te disse que havia entre nós recordações de infância?

- Amas! - exclamou Jorge, com uma impaciência a que era pouco sujeito. - Que amor! Um amor de que fazes confidentes os





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