- Deixe-me, minha mãe, deixe-me - rompeu o irritado rapaz. - Com'assim enquanto não largar esta coisa da regedoria, não tenho um momento de sossego.
- Então que foi?
- Que foi? Que havia de ser? O que foi ontem, e que há-de ser amanhã, e que há-de ser sempre, enquanto... enquanto se não fechar os olhos e se der para baixo, seja em quem for. Parece impossível que gente de educação, gente que devia ter vergonha e ser a primeira a mostrar o exemplo, seja a que anda por aí dando escândalo, sem fazer caso da autoridade, nem da lei, nem de coisa alguma! E um padre então! E um doutor!
- Pelo que vejo temos os do Cruzeiro fazendo das suas?
- Pois quem senão eles? Essa súcia de libertinos, de...
- Olha que está ali um primo deles, Clemente - admoestou a mãe, sorrindo.
Clemente reparou pela primeira vez em Maurício.
- Ah! desculpe, Sr. Maurício, que ainda agora o vejo. Mas isto é assim. Aqueles senhores cuidam... Eu sei lá o que eles cuidam? Cuidam talvez que isto hoje é como dantes e que eles hão-de fazer a sua vontade...
- Mas afinal de que se trata? - inquiriu Maurício.
- Desta vez deu-lhes para meterem em casa um refractário do serviço militar, contra quem há um mandado de captura, e com o maior descaramento o declaram por aí. Temos outra como quando esconderam em casa o assassino do reitor de Fieiras e lhe deram escapula para o Brasil. Mas eu não quero saber, a lei lá está que diz bem claro o que deve fazer-se, e o Sr. administrador não é para graças.
- Fia-te nele! Olh'agora! - atalhou a mãe. - É fresco! Vendo-te metido em talas, só se não puder deitar a mão à caravelha para te atenazar ainda mais. Não te lembras do que ele fez quando foi da prisão do morgado dos Codeços, por causa das pancadas na feira? Ora bem me fio eu nele! Todo colaço com o Lourenço do Cruzeiro, e companheiro de súcias deles todos.