Uma circunstância havia a que mais que a outras devia Jorge a aparição desse espectro, que, à semelhança da sombra do rei da Dinamarca, em Hamlet, ia exercendo uma funda influência no ânimo do adolescente.
Esta circunstância não era só para ele manifesta. Ao viajante que já supusemos parado a contemplar o vulto denegrido da Casa Mourisca não passaria ela também despercebida.
Na raiz da colina fronteira àquela onde o solar dos fidalgos erguia as suas torres ameadas, assentava o mais risonho e próspero casal dos arredores. Era uma completa casa rústica, conhecida por aqueles sítios pelo nome, que por excelência se lhe dera, de Herdade.
O contraste entre a Herdade e o velho solar era perfeito.
Ela graciosa e alvejante, ele severo e sombrio; de um lado, todos os sinais de actualidade, de vida, de trabalho, da indústria que tudo aproveita, que não dorme, que não descansa; a economia, a previdência, o futuro; do outro, o passado, a tradição estéril, o silêncio, a incúria, o desperdício, a ruína: a cada pedra que o tempo derrubava do palácio, correspondia uma que assentava na Herdade para alicerces de novas construções; aqui desmoronava-se um pavilhão, ali levantava-se um celeiro, uma azenha, um lagar; aos velhos carvalhos, às heras vigorosas,