- Estou a sangue-frio, creia.
- Veremos com mais vagar esse coração. É-me isso preciso para os meus planos.
- Os seus planos?!
- Então já te esqueceste que eu estou aqui principalmente por tua causa?
- Ah! sim, agradeço-lhe o cuidado; mas estou receando ter de dar-lhe muito que fazer.
- Veremos.
A noite chegou, e bem vagarosa para a impaciência de Maurício.
Pouco mais seria de Avé-Marias, já ele instava com os primos do Cruzeiro para que fossem pôr-se de vigia.
- Isso não vai assim - diziam eles. - Pois que cuidas tu? Não sabes que o pássaro é dos que só voam de noite? Fala-nos lá para as onze horas.
Maurício iludiu em todo este tempo a sua impaciência tentando provar aos primos com argumentos novos, que lhe tinham ocorrido em casa, a impossibilidade de ser para Berta a visita nocturna da Herdade.
Os primos respondiam rindo só com frases equívocas, que Maurício não compreendia.
- Olha cá, ó Maurício, - perguntou o mano doutor - em tua casa sabe-se do teu namoro com a filha do Tomé?
- Aí vens tu com o namoro!...
- Pois seja o que tu quiseres; da tua afeição, se achas mais bonito; mas sabem?
- Apenas o Jorge me fez a esse respeito algumas reflexões.
- Ah! O Jorge falou-te nisso?
- Há dias. Pelos modos o Tomé queixou-se-lhe...
- Ai, o Tomé queixou-se ao Jorge? Sim, senhor, tem graça. Que te parece, ó Lourenço?
- É bem bom! E então o Jorge deu-te conselhos, hem?
- Sim, disse-me alguma coisa; que era preciso cautela, que não era prudente o meu proceder...
- Ah!
- E quase me fez prometer que desistiria.
- Ah! fez-te prometer isso?
- Quase...
Os dois não podiam suster o riso.
- É impagável aquele Jorge! - repetia de quando em quando o padre.