- Vocês bem sabem o génio dele.
- Ai sabemos. Pois nós bem sabemos... o génio dele. Ah! Ah!...
E os risos redobravam.
Mas a noite chegara enfim e encerraram-se cada vez mais as sombras sobre os caminhos do campo. Maurício pôde finalmente acompanhar os primos ao lugar da espia.
Dirigiram-se ali por sítios menos frequentados, e sem soltarem uma palavra.
Maurício, a seu pesar, sentia-se dominado por uma comoção profunda. Não era só despeito, era já uma nascente de repugnância pelo acto que praticava. Envergonhava-se daquele furtivo mister de espião.
Chegados ao local, o padre escolheu a posição de maneira que pudessem ver sem serem vistos.
Por muito tempo nada descobriram; nem ouviram mais algum som além do melancólico gemer dos sapos, a distância.
Maurício, entre impaciente e satisfeito pelo resultado nulo da espionagem, principiava a dirigir aos primos alguns ditos epigramáticos, quando a mão do doutor lhe tapou a boca, ao mesmo tempo que o padre se voltava para lhe recomendar silêncio.
Efectivamente, encostado ao muro da Herdade, caminhava um homem, que a sombra da noite não deixava conhecer.
Chegando à porta, que devia estar apenas cerrada, empurrou-a e fechou-a de novo sem fazer ruído.
Maurício quis correr atrás daquele homem. Retiveram-no os primos.
- Espera, pateta! Deixa-o sair, que eu te prometo que havemos de conhecê-lo.
- Que diabo queres tu fazer, maluco? Não vês que espantas a caça?
- Hei-de ver quem ele é!
- Pois sim, mas para isso é preciso prudência.
- A porta ficou aberta. Eu vou...
- Vais aonde? Ora tem juízo. À saída pilhamo-lo.
Maurício, porém, insistiu e os primos condescenderam em passar um cauteloso exame à entrada por onde o vulto desaparecera.
Reprimindo a custo os ímpetos de Maurício, o padre dirigiu a exploração, e mui de mansinho entreabriu a porta e entraram no pátio da casa; perto ficava a escada por onde se subia para as salas.