Os Fidalgos da Casa Mourisca - Cap. 20: XX Pág. 268 / 519

Transpirara além disso cá fora o grande sucesso do dia do jantar na Casa Mourisca, e porventura a versão mais seguida saíra colorida por aquelas tintas maravilhosas com que o povo ilumina as suas narrativas. O que é certo é que este facto acabou de divinizar Jorge no conceito de Luísa, e agora menos do que nunca ela estava disposta a perdoar ao marido o haver prescindido dos conselhos de um rapaz tão brioso e prudente.

Berta escutou o arrazoado materno com ar pensativo e triste. Ouviu, sem a interromper, a longa exposição das excelentes qualidades do filho mais velho do fidalgo e os artigos de benévola acusação acremente formulados contra Tomé por quem aliás menos do que ninguém estava disposta a condená-lo.

De quando em quando a vista de Berta erguia-se para o vulto escuro da Casa Mourisca, e parecia que o aspecto dela lhe aumentava a melancolia.

Luísa saiu enfim da sala, chamada por as exigências do serviço doméstico.

Berta ficou só. Reclinando a cabeça à mão e apoiada no peitoril da janela, conservou por muito tempo a imobilidade e a fixidez do olhar, que denunciava uma grande abstracção.

Em que pensaria Berta?

Que nuvem cruzaria o seu firmamento, para assim lhe projectar sobre a fronte aquelas sombras de tristeza?

Operava-se uma revolução moral naquele espírito. Berta saíra criança da aldeia, levando entre as mais agradáveis memórias da infância a dos momentos passados na Casa Mourisca e a das pessoas a quem ali dera então os seus primeiros afectos.

Crescera, e essas imagens modificaram-se pela influência do amor na fantasia, pela influência da solidão e dos devaneios da juventude; a de Beatriz, como que santificada pela morte, cercara-se de um resplendor angélico, claro e suave como os raios do luar





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