Os Fidalgos da Casa Mourisca - Cap. 20: XX Pág. 278 / 519

Alvoroçou-se o coração do rapaz com isso; ao mesmo tempo, porém, ia subindo, na direcção da Herdade, um cavaleiro que ele reconheceu ser Maurício.

Esta nova descoberta desagradou-lhe manifestamente. Purpurearam-se-lhe as faces por momentos, e a fronte contraiu-se-lhe com uma expressão de desgosto. Pela primeira vez fustigou o cavalo, que até ali deixara entregue ao capricho.

Maurício, que também da outra margem avistara o irmão, fez-lhe um aceno com a mão, ao qual Jorge respondeu apontando-lhe para a Casa Mourisca, como a designar-lhe o motivo do seu passeio. Maurício replicou-lhe com um movimento de braços, exprimindo que o seu giro era mais extenso e para o outro lado. E na direcção que seguia era inevitável a passagem por casa de Tomé da Póvoa.

- Por isso ela se demorou na varanda - murmurou Jorge com amargura; e prosseguiu, olhando para Maurício:

- Aquele pode ser louco à sua vontade; ninguém lho estranhará, ninguém lhe fará disso um crime. E afinal talvez que de nós dois não seja ele o mais louco. A loucura é inseparável do homem; umas vezes toma-lhe a cabeça e deixa-lhe em paz o coração, que nunca se empenha nos desvarios a que ela é arrastada; é o caso de Maurício; outras vezes há na cabeça a frieza da razão e ao coração desce a loucura para o perturbar com afectos; quer-me parecer que é o que sucede comigo.

O cavalo parou espontaneamente à porta da Casa Mourisca e arrancou Jorge à corrente de vagas cogitações em que lhe flutuava o espírito.

- Vamos, Jorge - dizia ele a si mesmo, ao desmontar -, já agora é necessário ser rapaz de juízo até ao fim. Tu não tens direito de condescender com a tua mocidade, homem. Ninguém te relevaria os ardores da juventude, porque todos te supõem o sangue de gelo.

E, serenando outra vez a fisionomia, até ali um pouco alterada sob a influência de encontrados pensamentos, entrou para a quinta em procura de Tomé, que o precedera aí.





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