Os Fidalgos da Casa Mourisca - Cap. 20: XX Pág. 281 / 519

E, sentando-se ambos na borda do tanque, voltados na direcção da Casa Mourisca, cuja fachada se descobria por entre uma das árvores, Jorge prosseguiu:

- Agora que estamos sós, Tomé, vai dizer-me o que significa toda esta brincadeira.

À palavra «brincadeira», o fazendeiro deu um salto.

- Eu não o disse! Ele aí vem com as suas reflexões! Por essa esperava eu. Mas não tem dúvida, eu estou pronto para explicar-lhe a brincadeira. Se o Sr. Jorge visse, como eu vi, olharem as minhas acções como insultos, não serviços, que bem sei que não os fiz, mas pelo menos bons desejos, como são os que tenho de lhe ser útil e aos seus, também não havia de sofrer com tanta paciência a injustiça, que não procurasse tirar desforra.

E Tomé, levantando-se, pôs-se a passear agitado.

- Mas venha cá, Tomé, quem lhe diz que não tem razão em se ofender e até em se vingar nobremente, como empreendeu fazê-lo?

- Sim, mas então não chame brincadeira ao que faço - tornou o fazendeiro, amuado.

- Chamo por ver que não realiza a sua vingança por essa forma. O Tomé, se pensar a sangue-frio, há-de ser o primeiro a concordar comigo. Ora diga, pois acha que a obra mais difícil de levar a efeito em nossa casa é a limpeza destas ruas e destes tanques? Acha que vale a pena principiar por aqui a exercer as suas actividades? Se um dia, entrando em bom caminho a administração dos nossos bens, nos restituir, como espero, o pleno gozo deles, livre das demandas, dos ónus e da usura que os definham, não lhe parece que os nossos criados farão em dois ou três dias obra correspondente ao valor da sua vingança?

- Lá iremos. Da quinta subirei os degraus e entrarei em casa, que remoçarei do portal até aos telhados.

- E que é tudo isso para o muito que ainda haveria por fazer, e onde os seus auxílios poderiam ser-nos mais vantajosos? Não vale muito mais tudo o que já tem feito.





Os capítulos deste livro