Berta reconheceu um dia que não obrigara impunemente o espírito a pensar a todo o instante em Jorge. 
Assustou-a a descoberta, mas o efeito já não podia evitá-lo. Inquieta com os novos sentimentos que lhe invadiam o coração e a levavam a estas vagas apreensões, àquelas tristezas que tão frequentes lhe estavam sendo, não era outro o motivo da distracção com que escutara a mãe e da melancolia em que se deixou ficar à janela, depois que ela saiu. 
De repente estremeceu. 
Jorge, que já não procurava ocultar-se nas visitas que fazia a Tomé, e dava aos seus actos uma publicidade mais conforme com o seu carácter, acabara de entrar no pátio da Herdade, e, desmontando-se, prendia o cavalo, em que viera, ao esteio da ramada. 
Alguns criados, que andavam por ali, ocupados em diversos serviços da lavoura, descobriram-se ao vê-lo entrar. Jorge cortejou-os com afabilidade e passou a interrogá-los sobre pormenores do trabalho em que eles se entretinham. Os homens davam-lhe as informações pedidas com os maiores sinais de deferência. 
Depois Jorge subiu lentamente as escadas que conduziam à sala onde estava Berta. Ao vê-lo subir o primeiro degrau, ela tentou retirar-se; mas susteve-a uma inexplicável hesitação e, quando Jorge abriu a porta, ainda a encontrou na sala. 
O olhar de Jorge desviou-se de Berta, como se contrariado com a sua presença. 
- Vim talvez importuná-la? Perdoe. Ignorava que a acharia aqui - disse Jorge com aparente placidez. 
Berta não estava menos constrangida ao responder-lhe: 
- Importunar-me? De maneira alguma... Eu é que sinto que meu pai não esteja em casa, que é decerto quem o Sr. Jorge procurava. 
- Ah! seu pai não está em casa? 
- Não; saiu agora mesmo. 
Berta não ousou dizer para onde. 
O nome da Casa Mourisca recordaria a cena do jantar, e Berta tremia de recordá-la diante de Jorge.