Os Fidalgos da Casa Mourisca - Cap. 23: XXIII Pág. 327 / 519

- O destino desta família - repetiu o fidalgo, assombrando-se-lhe o semblante. - Triste destino!

- Confio nas orações daquele anjo.

- Quando uma família cumpre no mundo uma dolorosa expiação, nem os corações dos anjos podem aliviá-la dela. Deus afastou do mundo a inocente e fraca, para me deixar só a mim o peso do meu infortúnio e o das longas culpas dos nossos. Ele bem sabia que enquanto a tivesse ao meu lado para arrimo nem sentiria o castigo. Aceito a sentença de Deus, procurarei cumpri-la com firmeza, e oxalá que meus filhos, recebendo o sinistro legado, não desfaleçam como covardes.

- Não pense nessas coisas, meu padrinho. Tenho fé que ainda voltarão dias felizes para esta casa.

- Sim; quando a comprar em hasta pública qualquer proprietário endinheirado, que faça depois ressoar por estas salas os sons dos bailes e dos festins. A casa verá então dias alegres, verá. E quem se lembrará dos velhos senhores dela, cujos descendentes talvez aceitem um lugar de conviva à mesa do novo proprietário? Porque vamos para uma época de fáceis condescendências.

Berta calou-se, baixando os olhos, porque pressentia perigos na direcção que levava a conversa.

D. Luís tinha delicadeza para compreender a discrição de Berta, e, mudando de tom, continuou:

- Mas perdoa-me, Berta; estas ideias tristes da velhice não são para a tua idade. É uma crueldade da minha parte não guardar para mim estes pensamentos.

- Se eu pudesse desvanecê-los!

O fidalgo limitou-se a fazer um gesto de negação.

Neste momento ouviu-se nas escadas um rumor de passos e de vozes, que a ambos fez estremecer.

- É teu pai, Berta? - perguntou D. Luís, erguendo-se e olhando em redor com inquietação.

- Meu pai não está na terra. Há três dias que partiu e não o esperamos ainda hoje - respondeu Berta, sobressaltada também.





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