Os Fidalgos da Casa Mourisca - Cap. 29: XXIX Pág. 403 / 519

Ao meio-dia, porém, hora em que a baronesa costumava por suas próprias mãos servir-lhe algumas colheres de geleia e um cálice de vinho do Porto, sentiu que lhe abriam mansamente a porta do quarto, com a mesma cautela, com o mesmo cuidado com que o fazia Gabriela.

Deu-lhe rebate o coracão, e no meio dos tristes pensamentos que o acabrunhavam, fez-se um clarão de esperanças. Voltado com as costas para a porta, D. Luís não pôde conhecer logo a pessoa que entrava, por isso perguntou com uma voz, em que se denunciava o íntimo sobressalto que estava sentindo:

- Quem vem aí?

Ninguém lhe respondeu; mas percebeu claramente o som de uns passos leves, que não podiam deixar de ser de mulher.

- Quem está aí? - repetiu D. Luís, fazendo um esforço para voltar-se.

Mas neste momento parava defronte dele Berta, com um sorriso nos lábios, e segurando nas mãos a bandeja com o cálice de vinho e a geleia que a baronesa costumava servir-lhe.

D. Luís olhou para a afilhada com a expressão da maior surpresa e espanto.

- Berta! - exclamou ele, solevantando o corpo. - Berta aqui?!

- E há mais tempo seria este o meu lugar, se não soubesse que até hoje lhe não faltavam os cuidados de que a sua doença precisa.

- E vens... para ficar? - perguntou o doente com uma inflexão de alegria quase infantil.

- Se me der licença que fique...

- Se te der licenca, filha!...

De súbito reprimiu a sua expressão de alegria, e emendou em tom mais grave:

- Não, Berta; não é aqui o teu lugar. Eu não sou teu pai.

- Mas é meu padrinho e está doente. E à cabeceira de um doente uma mulher está sempre no seu lugar. É o nosso posto de honra - respondeu Berta, com aquela entonação carinhosa com que as raparigas sabem enfeitiçar o coração e enlear a vontade dos seus velhos pais e avós.





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