D. Luís contraiu as sobrancelhas, como se esta resposta lhe fizesse suspeitar uma dissimulação.
- Pois então Jorge nunca falaria contigo?
- Muito de passagem, quando por acaso me encontrava e sempre com umas maneiras tais, que cheguei a acreditar que me que-ria mal por algum motivo desconhecido para mim.
D. Luís fez um gesto de desgosto e de novo lhe assomaram ao semblante os vestígios da desvanecida irritação.
- Não esperava isso de ti, Berta. Tu não és sincera comigo.
- Eu?
- Tu iludes-me como os outros, afinal, conspiras com eles contra a tranquilidade dos meus dias, contra o sossego deste coração atribulado. Deus te perdoe o mal que me fazes, tu, mais do que ninguém, porque te queria deveras.
- Jesus, Sr. D. Luís, meu padrinho, que quer dizer? Em que lhe fiz eu mal? Por amor de Deus, diga, fale-me claro.
- Berta, é preciso que me digas a verdade, se queres que não suspeite de ti, como suspeito dos outros, como suspeito de todos; é preciso que não dissimules, como eles fazem, para me iludirem.
- Mas que quer que lhe diga, Sr. D. Luís? Prometo dizer-lhe a verdade, nem eu lhe sei mentir.
- Então para que me dizes que Jorge te queria mal?
Berta sentia-se cada vez mais sobressaltada pelas perguntas do fidalgo, que pareciam dirigir-se ao segredo recatado que ela conservava no coração.
- Eu disse - respondeu ela - que cheguei a pensar que o Sr. Jorge me queria mal, porém...
A confusão que sentia não a deixou continuar.
O fidalgo notou aquela perturbação e abrandou mais a voz, tomou um tom carinhoso e disse, pegando-lhe afectuosamente na mão:
- Vamos, Berta, sossega. Acredita que tens em mim um amigo, e abre-me francamente o coração sem receio. Diz-me: é verdade que Jorge te disse alguma vez que te amava? É verdade que entre vós ambos há alguma afeição, alguma promessa?
A pergunta, ainda que não já de todo inesperada, sobressaltou Berta, que não atinou com o que respondesse.