- Mas... por que se retirou Berta?
D. Luís não respondeu logo a esta pergunta, que parecia contrariá-lo, porque lhe chamou à fronte uma contracção de desgosto.
- Ai, raparigas! - tornou a baronesa- ferve-lhes o sangue afinal.
- Não diga isso, Gabriela, que é injusta. Berta é um anjo de abnegação.
- Mas para que havia o anjo de abandonar o seu posto?
- Vieram buscá-la.
- Quem?
- O pai.
- Pois o Tomé da Póvoa seria capaz de levá-la daqui contra a vontade dela e do padrinho?
- O Tomé teve razão para o fazer. Eu mesmo lhe disse que devia levá-la.
- Ah! então não entendo.
- Há sacrifícios tão dolorosos, que não é justo exigi-los nem permiti-los.
- E o que Berta fazia, ficando aqui a seu lado, era dessa natureza?
- Talvez fosse.
- Não posso conceber de que maneira.
D. Luís, cansado do esforço que fazia para falar ou hesitando no que dissesse, não respondeu logo. Depois murmurou:
- Aquela pobre rapariga tem uma alma nobre e heróica. Não seria ela que se trairia por um sinal de dor, ainda quando sentisse despedaçar-se-lhe o coração.
- E corria esses riscos aqui? - perguntou a baronesa com afectada candura.
- Gabriela - continuou D. Luís -, Berta saiu vitoriosa de uma grande luta. O coração, porém, ainda lhe devia sangrar, e não era aqui que se lhe consolidariam as cicatrizes.
- São tão vagos esses dizeres! Ora vamos: diga-me o que houve; fale-me claro.
- Que havia de ser? Berta é um anjo, mas sob a encarnação de mulher, tem um coração... e esse, sujeito a apaixonar-se como os outros.
Gabriela fez um gesto de quem tivera uma ideia súbita.
- Ah! Já sei! Percebo agora! Era a isso que aludia? Cuidei que seria outra coisa mais grave.
D. Luís fixou na sobrinha um olhar admirado.