Lord Jim - Cap. 24: Capítulo XXIII Pág. 250 / 434

Houve um momento de real e profunda intimidade, inesperado e fugaz como a visão de uma verdade eterna e redentora. Esforçou-se por me consolar, como se, dos dois, fosse ele o mais experiente. 'Está bem, está bem', dizia-me comovido. 'Prometo ter cuidado comigo. Muito bem, não correrei riscos inúteis. Nem um único. Pois está claro, quero seguir para a frente. Caramba! Sinto que nada me pode tocar. Isto é que é sorte. Nunca daria cabo de uma sorte destas!... Uma oportunidade magnífica!... ' Ele dizia 'uma oportunidade magnífica' e tinha razão, pois esta era magnífica, mas as oportunidades são o que os homens fazem delas, e como podia eu adivinhar? Como ele bem o disse, até eu... até eu recordava... a sua... a sua desgraça... e lha deitava à cara. E era verdade. O melhor era, sem dúvida, partir.

«O meu escaler ficou na esteira do bergantim, e eu via Jim à ré recortado na luz do Sol em silhueta, a agitar o boné por cima da cabeça. Ouvi uma exclamação indistinta: 'Hei-de mandar-lhe notícias.' Não percebi bem se dizia 'hei-de' ou 'hão-de'. Creio que devia ter sido 'hão-de'. Os meus olhos estavam cegos pelo brilho do mar e não o via com clareza. Estava destinado a nunca chegar a vê-lo com clareza; mas uma coisa lhes posso assegurar: era que ninguém parecia menos 'a similitude de um cadáver', como o mestiço agoirento dissera, cujo rosto, com a forma e a cor da abóbora madura, via a espreitar por debaixo do braço de Jim.

E levantou a certa altura, também um braço, como se quisesse dar um soco no vazio. Absit omen!»





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