Lord Jim - Cap. 9: Capítulo VIII Pág. 96 / 434

Tinha adquirido o uso suficiente da língua para compreender a palavra 'água' repetida várias vezes num tom insistente de prece, quase de desespero. Deu-lhe um empurrão e sentiu um braço em volta da perna.

«'O patife agarrou-se a mim como um homem que se está a afogar', disse ele impressionado. 'Água, água! De que água falava ele? Que sabia? Tão calmamente quanto me foi possível, ordenei-lhe que me largasse. Obrigava-me a deter-me, o tempo urgia, outros homens começaram a mexer-se e eu precisava de tempo - de tempo para cortar os rizes e pôr os salva-vidas em condições de flutuar. Agora segurava-me a mão e senti que era muito capaz de começar a gritar. Num relâmpago compreendi que seria o suficiente para lançar o pânico. Então puxei-o com o braço que tinha livre e arremessei-lhe a lâmpada à cara. O vidro retiniu, a luz apagou-se, mas o golpe fê-lo largar-me, e eu escapei-me - só queria chegar aos salva-vidas; só queria chegar aos salva-vidas. O homem saltou por detrás em minha perseguição. Virei-me contra ele. Não se queria calar; tentou gritar; quase o estrangulei antes de compreender o que ele queria. Queria um pouco de água para beber. A água estava rigorosamente racionada, sabe, e ele tinha um rapazinho que eu vira várias vezes: era seu filho, estava doente e tinha sede. Ele vira-me passar e pedia-me um pouco de água. Era só isto. Encontrávamo-nos debaixo da ponte, no escuro. Continuava a agarrar os meus pulsos; não havia maneira de me livrar dele. Precipitei-me para o meu beliche, agarrei a minha garrafa de água e meti-lha nas mãos. Desapareceu. Só então percebi a necessidade que eu próprio tinha de beber qualquer coisa.' Debruçou-se apoiado num cotovelo com uma mão sobre os olhos.

«Um arrepio percorreu-me o corpo; havia qualquer coisa de singular em tudo isto.





Os capítulos deste livro