Era uma aventura bizarra e empolgante na bruma, uma revelação extraordinária, e saíra-lhe da boca como a coisa mais natural do mundo. Lutou contra esse impulso e então tornou-se consciente do silêncio. Disse-mo ele. Um silêncio de mar e de céu, fundido numa vastidão incerta, imóvel como a morte, parado, a envolver estas vidas salvas, palpitantes. 'Podia ouvir-se, no salva-vidas, o ruído do cair de um alfinete', disse, com uma curiosa contracção da boca, como um homem que tenta dominar a sua sensibilidade para contar um facto muito comovente. Um silêncio! Só Deus, que o criara, sabia o que se passava no seu coração. 'Eu pensava que não era possível haver na Terra outro lugar tão quieto como aquele', disse ele. 'Não se podia distinguir o céu do mar, não se ouvia nem se via nada: nem uma luz bruxulente, nem uma forma, nem um som. Chegava-se a acreditar que a Terra inteira se tinha afundado; que todos os homens, salvo eu e aqueles patifes que estavam comigo no barco, se tinham afogado.' Estava debruçado sobre a mesa com as mãos metidas pelo meio das chávenas do café, dos copos de licor e das pontas de charuto. 'Parecia-me que acreditava realmente nisso. Tudo desaparecera e... tudo terminara...', concluiu, arrancando do peito um suspiro profundo... para mim. »
Marlow sentou-se bruscamente e arremessou com força o charuto. Este partiu como um flecha e deixou um rasto vermelho, como um pequeno foguete lançado de entre as cortinas de trepadeiras. Ninguém se mexeu. «Eh, que lhes parece isto?», exclamou subitamente animado. «Era fiel si próprio, não era? A vida que salvara estava terminada para sempre por alta de chão onde pousar os pés, por falta de imagens para os seus olhos ar falta de vozes para os seus ouvidos. O aniquilamento, hem? E o que havia unicamente era um céu coberto de nuvens, um mar sem quebrar de ondas, o ar imóvel.