Eu devia ter ficado um pouco alarmado: tudo aconteceu de uma maneira muito calma e com uma rapidez enorme. Eu sabia que não havia no barco nenhuma outra antepara senão aquela onde se dera a colisão e que separava o pique de vante do porão da proa. Voltei atrás para prevenir o comandante. Encontrei o segundo-maquinista a levantar-se do chão no fundo da escada da ponte; parecia atontado e disse-me que julgara ter quebrado o braço esquerdo: escorregara no primeiro degrau quando descia, enquanto eu tinha ido à proa. Exclamou: 'Meu Deus! Essa antepara carunchosa vai ceder dentro de minutos e esta maldita porcaria vai afundar-se sob os nossos pés como uma massa de chumbo.' Empurrou-me com o braço direito e subiu as escadas à minha frente a gritar. O braço esquerdo pendia-lhe inerte. Cheguei ao cimo da escada a tempo de ver o comandante precipitar-se sobre ele e estendê-lo ao comprido com um soco. Atingiu-o uma única vez: debruçou-se sobre ele e falou-lhe num tom furioso mas muito baixo. Suponho que lhe estava a perguntar por que diabo não fora parar as máquinas em vez de fazer aquela gritaria no convés. Ouvi-o dizer: 'Levante-se! Corra! Voe!' Pôs-se também a praguejar. O maquinista deslizou pela escada de estibordo, deu a volta à clarabóia e enfiou-se a correr para a casa das máquinas pela escotilha que ficava a bombordo. Gemia...»
Falava devagar: as recordações acudiam-lhe à memória com prontidão e uma extrema nitidez; poderia ter reproduzido como um eco os gemidos do maquinista para perfeita informação daqueles homens que queriam factos. Depois do seu primeiro sentimento de revolta, chegara à conclusão de que só uma precisão meticulosa nas declarações podia trazer à luz o horror verdadeiro que está por "detrás da temível aparência das coisas.