Lord Jim - Cap. 33: Capítulo XXXII Pág. 320 / 434

Aqui crescera sem nada ver, sem nada compreender, sem de nada fazer ideia. Perguntei a mim mesmo se não estaria convencida de que não existia mais nada. Não posso conceber que ideia podia ela fazer do mundo exterior: tudo o que ela conhecia desse mundo era uma mulher traída e um bobo sinistro. O seu amante também dele tinha vindo, dotado de irresistíveis seduções; mas que seria dela se ele voltasse para essas regiões inimagináveis que pareciam reclamar sempre. Os seus filhos? A mãe tinha-a posto de sobreaviso, com lágrimas nos olhos, antes de morrer...

«Ela segurara-me o braço com firmeza, e logo que parei retirou a mão rapidamente. Era audaciosa e tímida. Não tinha medo de nada, mas sentia-se refreada pela incerteza profunda e a estranheza extrema da situação; era uma pessoa corajosa às apalpadelas na escuridão. Eu pertencia a esse desconhecido que, de um momento para o outro, poderia reclamar Jim como um dos seus. Estava, por assim dizer, no segredo da sua natureza e das suas intenções, era o confidente de um mistério ameaçador, estava armado talvez do seu poder. Ela devia julgar que eu podia arrancá-lo dos seus braços com uma única palavra; estou sinceramente convencido de que sofreu agonias de terror durante as minhas longas conversas com Jim e uma angústia real e intolerável que podia tê-la levado a planear a minha morte, se o frenesim que se apossara do seu coração tivesse igualado a tremenda situação que criara. Esta é a minha impressão e é tudo o que lhes posso dizer: comecei a aperceber-me dos factos gradualmente, e à medida que via mais claro ia sendo dominado por uma incredulidade muda e estupefacta. Soube inspirar-me confiança, mas nenhuma palavra da minha boca pode traduzir o efeito do murmúrio precipitado e veemente, do tom doce e apaixonado, da súbita pausa da respiração suspensa e do gesto suplicante dos braços claros, bruscamente estendidos.

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