Lord Jim - Cap. 9: Capítulo VIII Pág. 97 / 434

Os dedos da mão posta sobre os olhos tremiam ligeiramente. Ele quebrou o breve momento de silêncio.

«'Estas coisas só acontecem uma vez na vida de um homem, e... Ah, bem! Quando finalmente cheguei à ponte, os patifes estavam a desamarrar um dos salva-vidas! Um salva-vidas! Subia eu as escadas a correr quando uma pancada me atingiu no ombro, não me apanhando por pouco a cabeça. Não parei, e o maquinista-chefe - que tinham arrancado do seu beliche - voltou a levantar a travessa contra mim. De qualquer modo, nada disto me surpreendia. Tudo me parecia natural - e horrível! Esquivei novo golpe desse louco miserável, levantei-o como se fosse uma criancinha, e ele começou a murmurar nos meus braços: «Deixe-me! Deixe-me! Pensei que você fosse um daqueles negros.» Lancei-o ao chão, escorregou ao longo da ponte, foi embater nas pernas do tipo pequenino, o segundo-maquinista, e fê-lo cair. O capitão, muito atarefado com o salva-vidas, olhou para o lado e veio direito a mim com a cabeça baixa, a rugir como um animal selvagem. Fiquei quieto como uma pedra. Ali de pé era tão sólido como isto e bateu ligeiramente com os nós dos dedos na parede ao lado da cadeira. 'Era como se eu tivesse já ouvido tudo isso, tivesse visto e passado por tudo isso vinte vezes. Não tinha medo deles. Eu levantara o punho no ar e ele parou de repente, murmurando: «Ah!, é você. Venha ajudar-me, depressa.»

«Foi exactamente o que ele disse. Depressa! Como se alguém pudesse andar depressa bastante. «Não vai tomar providências?», perguntei. «Sim. Vou-me raspar», rosnou por cima do ombro.'

«Creio que naquele momento não compreendi o que ele queria dizer.

Os outros dois já se tinham levantado e corriam ambos para o salva-vidas. Andavam rapidamente à volta com passos pesados, resfolegavam, atropelavam-se, amaldiçoavam o salva-vidas, o barco, amaldiçoavam-se um ao outro - e a mim; entre dentes.





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