Lord Jim - Cap. 22: Capítulo XXI Pág. 230 / 434

Voltamos para enfrentar os nossos superiores, os nossos parentes, os nossos amigos, aqueles a quem obedecemos e aquele a quem amamos; mas mesmo os que não têm ninguém, os mais independentes, os mais solitários, os mais libertos de toda a espécie de laços, mesmo aqueles para quem a palavra «pátria» não evoca um rosto querido, nem uma voz familiar, têm de enfrentar a alma da sua terra, a alma que lhe habita o ar e o céu, os vales e as colinas, os campos, as águas e os bosques, e que é um amigo mundo, um juiz e um inspirador. Digam o que disserem, para gozar a alegria da volta, para respirar a paz e enfrentar a verdade, é necessário ter uma consciência limpa. Tudo isto lhes pode parecer puro sentimentalismo e poucos têm o desejo ou são capazes de olhar conscienciosamente o que se esconde debaixo das emoções familiares. Há as mulheres que amamos, os homens para quem levantamos os olhos, a ternura, a amizade, as oportunidades, os prazeres... Mas o facto é que precisamos de ter as mãos limpas para receber a recompensa, senão esta transformar-se-á em folhas mortas, em espinhos, entre os dedos. Creio que são os solitários sem um lar ou uma afeição que possam chamar sua, aqueles que voltam não para uma casa, mas para uma pátria ao encontro da sua alma desencartada, eterna e imutável, os que melhor compreendem a sua severidade, o seu poder salvador, a graça do seu direito secular à nossa fidelidade, à nossa obediência. Sim!, poucos de nós compreendem isto, mas todos o sentem, porém, e digo todos, sem excepção porque os que não sentem assim não contam. A planta mais pequenina tira a força e a vida de um cantinho de terra; assim está o homem também enraizado na terra onde vai buscar a fé e a vida. Não sei até que ponto Jim compreendia, mas sei que sentia confusamente, mas com intensidade, a exigência desta verdade, ou desta ilusão - não me importo com o nome que lhe derem; a diferença é tão pouco e tão pouco significativa.




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