Lord Jim - Cap. 24: Capítulo XXIII Pág. 246 / 434

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«'Voltar para quê?', perguntou distraído a olhar para o relógio de parede. «Não respondi logo, mas passado um momento perguntei: 'Nunca mais voltará?' 'Nunca mais', respondeu sonhador, sem olhar para mim; e de repente recomeçou a agitar-se. 'Caramba! São já duas horas e embarco às quatro!'

«Assim era. Um bergantim de Stein partia nessa tarde para oeste e devia levar Jim; Stein esquecera-se com certeza de ordenar que a hora da partida fosse adiada. Foi a correr buscar as suas coisas e eu fui para bordo do meu barco, onde ele prometeu ir-se despedir quando passasse a caminho do ancoradouro exterior, onde se encontrava o bergantim. Assim fez, muito apressado e com uma pequena mala de couro na mão. Esta era insuficiente, e eu ofereci-lhe um velho malão de folha impermeável pelo menos à humidade. Transferiu as suas coisas da mala para o malão pelo simples processo de esvaziar aquela para dentro deste, como se fosse um saco de milho. Vi cair três livros no meio da confusão - dois pequenos de capa escura e um grosso volume verde com dourados: as obras completas de Shakespeare. 'Você lê Shakespeare?' perguntei. 'Leio. É a melhor coisa para levantar o moral', disse rápido. Fiquei impressionado com esta apreciação mas não havia tempo para conversas desse género. Sobre a mesa da minha cabina estavam um revólver e duas caixas de munições. 'Peço-lhe que aceite este presente', disse-lhe. 'Pode servir para o ajudar a ficar.' Mal acabei de dizes estas palavras, apercebi-me da significação sinistra que podiam comportar. 'Pode ajudá-lo a entrar', corrigi eu, cheio de remorsos. Ele, porém, não se deixava perturbar por alusões obscuras; agradeceu-me efusivamente e gritou um adeus por cima do ombro. Ouvi a sua voz dar pressa aos remadores e da vigia da proa vi o escaler que o levava passar ao longo do barco, dobrar à ré a afastar-se.





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