Lord Jim - Cap. 37: Capítulo XXXVI Pág. 354 / 434

Instantes depois, fez uma nova tentativa e garatujou. outra linha pesadamente, como se tivesse uma mão de chumbo. 'Agora preciso, sem demora...' A pena fez outro borrão e, desta vez, desistiu. Não há mais nada; tinha visto um abismo profundo que nenhum olhar nem nenhuma voz podiam transpor. É compreensível. Estava esmagado pelo inexplicável; esmagado pela sua própria personalidade, a dádiva desse destino que ele fizera o possível por dominar.

«Envio-lhe também uma velha carta, uma carta muito antiga, que encontraram cuidadosamente conservada na sua escrivaninha. É uma carta do pai, e pela data pode ver que a deve ter recebido alguns dias antes de embarcar no Patna. Deve ser, portanto, a última carta que recebeu de casa. Conservou-a como um tesouro durante todos esses anos. O velho e bom pastor gostava muito do filho marinheiro. Li algumas frases por alto, aqui e ali. Está cheia de ternura. Diz ao seu 'querido Jaime' que a última e longa carta era muito 'boa e interessante'. Não gostaria contudo de vê-lo 'julgar os homens severa e apressadamente'. São quatro páginas de moralidade fácil e notícias da família. Tom 'fora ordenado'. O marido de Carrie sofrera prejuízos. O velhote continuava a confiar equitativamente na Providência e na ordem estabelecida do universo, mas estava atento aos seus pequenos perigos e pobres graças. Podemos imaginá-lo, grisalho e sereno, no refúgio inviolável do seu quarto de estudo, confortável e desbotado, com as paredes cobertas de prateleiras de livros, e onde durante quarenta anos dera, conscienciosamente e vezes sem conta, a volta aos seus humildes pensamentos sobre a fé e as virtudes, sobre a conduta na vida e a única maneira decente de morrer; onde escrevera tantos sermões; onde se sentara para falar com o seu rapaz, tão longe, no outro lado da Terra.





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