Lord Jim - Cap. 38: Capítulo XXXVII Pág. 361 / 434

Atravessei uma delas e na outra vi uma jovem sentada na extremidade de uma mesa de mogno sobre a qual pousava a cabeça, com o rosto escondido entre os braços. O soalho, encerado, reflectia vagamente a sua imagem, como se fosse uma toalha de água gelada. Os estores de junco estavam abaixados, e, através da estranha penumbra esverdeada filtrada pela folhagem das árvores, lá fora, sopravam, lufadas de vento forte que faziam ondear as longas cortinas das janelas e das portas. A sua forma branca parecia modelada em neve; os pingentes de cristal de um grande candelabro tilintavam por cima da sua cabeça, como estalactites de gelo, cintilantes. Ergueu os olhos, quando me aproximei. Sentia-me arrepiado, como se estes vastos aposentos fossem a fria mansão do desespero.

«Ela reconheceu-me imediatamente, e, assim que me detive e baixei os olhos sobre ela, disse, num tom tranquilo: 'Ele deixou-me, vocês deixam-nos sempre... para seguirem o vosso caminho.' O seu rosto conservava-se sombrio. Todo o calor vital parecia ter-se refugiado nalgum ponto inacessível do peito. 'Teria sido fácil morrer com ele', prosseguiu, e fez um ligeiro gesto de cansaço, como se renunciasse ao incompreensível 'Ele não queria! Era como uma cegueira... e contudo era eu que falava com ele; era eu que estava em frente dos seus olhos; era para mim que ele olhava todo o tempo. Ah!, vocês são duros, falsos, pérfidos, impiedosos. Que é que vos torna tão maus? Ou será que vocês são todos loucos?'

«Peguei-lhe na mão, que não correspondeu ao meu aperto, e, quando a larguei, ficou pendente. Aquela indiferença, mais terrível do que as lágrimas, os gritos e as censuras, parecia desafiar o tempo e as consolações. Sentia-se que nada do que se pudesse dizer atingiria o centro daquela dor muda e enternecedora.





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