Lord Jim - Cap. 9: Capítulo VIII Pág. 98 / 434

Eu não me mexia, nem falava. Vigiava atentamente a inclinação do barco, tão imóvel como numa doca seca porém, assim.' Levantou a mão com a palma para baixo e as pontas dos dedos inclinadas para o chão. 'Assim', repetiu. 'Eu via a linha do horizonte na minha frente muito nítida, por cima do talha-mar; via a água ao longe negra e cintilante, e parada - parada como uma lagoa, num silêncio de morte, parada como nunca o esteve a água de nenhum mar -, tão parada que me era insuportável a sua vista. Já viu alguma vez um barco a flutuar com a proa debaixo de água, retardado o afundamento por uma chapa de ferro, tão velha e tão podre que não suporta uma escora? Já viu isto alguma vez? Sim, que não suporta uma escora? Eu pensava nisso - e na inexorabilidade das coisas; mas poder-se-á escoar uma antepara em cinco minutos - ou mesmo em cinquenta? Onde ia eu buscar homens que quisessem descer até lá? E a madeira? - a madeira? Era capaz de brandir o maço e dar o primeiro golpe se tivesse visto aquela antepara? Não diga que sim: não a viu; ninguém teria essa coragem. Caramba! Para fazer uma coisa dessas é preciso acreditar que há uma probabilidade, uma entre mil, pelo menos uma sombra de probabilidade; e o senhor não teria acreditado que a houvesse. Ninguém teria acreditado. Julga-me um cobarde por ter ficado ali sem fazer nada; mas que teria feito o senhor? O quê? Não sabe, nem ninguém sabe. É necessário tempo para nos adaptarmos a novas circunstâncias. Que queria que eu fizesse? Teria sido uma boa acção pôr toda aquela gente que eu sozinho não podia salvar louca de medo - que nem eu nem ninguém podia salvar? Olhe cá! Tão verdade como eu estar agora sentado nesta cadeira na sua frente... '

«Depois de cada duas ou três palavras, parava para tomar fôlego em pequenos sorvos e lançava-me olhadelas rápidas, como se no meio da sua angústia permanecesse atento ao efeito.





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