Era um projecto perfeitamente legítimo. Contudo, depois de escritas algumas páginas, senti-me descontente, por uma razão que desconheço, e pu-las de lado por um tempo. Não as tirei da gaveta até que o falecido Sr. William Blackwood me sugeriu que lhe desse outra vez qualquer coisa para publicar na sua revista.
Só então percebi que o episódio do barco dos peregrinos era um bom ponto de partida para uma narrativa de liberdade e vagabundagem; e era também um acontecimento que podia, de maneira plausível dar cor ao «sentimento da existência» de uma personagem simples e sensível. Mas essas primeiras disposições do espírito e agitações da alma eram bastante indefinidas nessa altura, e ainda hoje não me parecem mais claras depois de tantos anos terem passado.
O pequeno maço de folhas que pusera de parte não deixou também de ter o seu peso na escolha do assunto. Mas tudo foi reescrito deliberadamente. Quando me sentei à mesa de trabalho para o fazer, sabia que seria um livro longo, embora não tivesse previsto que a sua publicação se prolongasse por treze números de Maga.
Perguntaram-me várias vezes se não é este, entre todos os que escrevi, o livro de que gosto mais. Sou grande inimigo de favoritismos na vida pública, na vida particular e até mesmo nas relações melindrosas entre um autor e os seus livros. Por princípio, não tenho favoritos; mas não vou ao ponto de me sentir ofendido e molestado pela preferência que algumas pessoas dão ao meu Lord Jim. Nem direi sequer que «não consigo perceber...». Não... Mas um dia houve em que fiquei perplexo e surpreendido.
Um meu amigo que regressara de Itália falara ali com uma senhora que não tinha gostado do livro. Eu lastimei, é claro, mas o que me surpreendeu foi o motivo do seu desagrado.