Lord Jim - Cap. 35: Capítulo XXXIV Pág. 342 / 434

.. Ah! Ele... ele... ele chega aqui, vindo só o Diabo sabe donde... Chega aqui… só o Diabo sabe para quê... para me calcar aos pés até eu morrer... Ah… pisar-me!' (bateu suavemente com os dois pés no chão), 'pisar-me desta maneira... não se sabe porquê... até eu morrer... ' A sua voz tornou-se sumida; sacudia-o uma leve tosse; aproximou-se até muito perto do cercado e, num tom lastimoso e confidencial, disse-me que não se deixaria pisar. 'Paciência... paciência', murmurava ele e batia no peito. Eu deixara de rir, mas de repente foi ele que me fez estremecer com uma gargalhada de demente. 'Ah!, ah!, ah! Veremos! Veremos! Quê?! Roubar-me? Roubar-me tudo?!... Tudo!... Tudo!' Deixou cair a cabeça sobre o ombro; as mãos, com os dedos entrelaçados, pendiam diante dele. Julgar-se-ia que alimentava uma ternura extrema pela jovem e que a sua alma fora amarfanhada e o seu coração destroçado pela mais cruel das espoliações. Subitamente, levantou a cabeça e gritou uma blasfémia: 'Como a mãe - e falsa como a mãe. Exactamente. Até na cara se lhe vê... na cara. O Diabo!' Apoiou a testa na sebe e, nessa posição, proferiu ameaças e blasfémias horríveis em português; soltava exclamações surdas, misturadas com lamentos e gemidos lastimosos que saíam acompanhados de movimentos convulsivos dos ombros, como se tivesse sido atacado por uma crise mortal. Era um espectáculo vil e grotesco, e eu afastei-me apressadamente. Ele tentou gritar-me qualquer coisa. Palavras insultuosas contra Jim, parece-me. Mas não demasiadamente alto, pois estávamos muito próximo da casa. Tudo o que ouvi distintamente foi: 'Não passa de uma criança... de uma criança.'»





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