Lord Jim - Cap. 8: Capítulo VII Pág. 93 / 434

«Um barulho discreto do tinir da louça chegava até nós pelas altas janelas. Ouviram-se subitamente vozes: um grupo de homens saíram para a esplanada em grande animação. Trocavam recordações jocosas acerca dos burros do Cairo. Um jovem pálido com um ar inquieto, de longas pernas altas e andar mole, era alvo das pilhérias de um pomposo e rubicundo globe-trotter por causa das suas compras no bazar. 'Não, mas a sério - pensa que fui enganado a esse ponto?; perguntava ele muito grave e circunspecto. O grupo afastou-se e foi-se deixando cair nas cadeiras aqui e ali; acenderam-se fósforos, que iluminavam uns segundos rostos sem sombra de expressão e o brilho baço dos peitilhos das camisas; o sussurrar de conversas animadas pelo calor da festa soava como qualquer coisa de absurdo e infinitamente remoto.

«Tema parte da tripulação estava a dormir na primeira escotilha ao alcance da minha mão', recomeçou Jim a dizer.

«É preciso que saibam que naquele barco se fazia o quarto segundo a regra de Kalashee: os marinheiros dormiam a noite inteira e só eram chamados os substitutos dos quartéis-mestres e os vigias. Sentiu a tentação de agarrar o braço do lascar mais próximo, mas não o fez. Uma força retinha-lhe os braços caídos ao longo do corpo Não estava assustado - oh, não!, só não podia mexê-los, era tudo. Não estava talvez assustado com a morte, mas vou-lhes dizer uma coisa: estava assustado com o inesperado. A sua maldita imaginação pusera-lhe diante dos olhos todos os horrores do pânico, o tropel precipitado, os gritos lamentosos, os salva-vidas a afundarem-se inundados - todos os incidentes pavorosos de um sinistro marítimo de que ouvira falar. Poder-se-ia ter resignado a morrer, mas desconfio de que queria morrer sem terrores acessórios, calmamente, numa espécie de transe sereno.





Os capítulos deste livro