Lord Jim - Cap. 21: Capítulo XX Pág. 215 / 434

Assim acabou a primeira parte aventurosa da sua vida. O que se seguiu foi de tal maneira diferente que sem a realidade desse desgosto pungente poder-lhe-ia parecer um sonho. Tinha algum dinheiro; recomeçou a vida, e dentro de alguns anos juntou uma fortuna considerável. Viajara primeiro muito, de ilha para ilha, mas a idade chegara e ultimamente era raro deixar a sua espaçosa casa, situada a três milhas da cidade, rodeada por um grande jardim, por estábulos, arrecadações e cabanas de bambu para os numerosos servos e empregados. Partia todas as manhãs na ca carrinha para a cidade, onde tinha os escritórios e empregava brancos - chineses. Era dono de uma pequena frota de escunas e de embarcações dignas e comerciava em alta escala com os produtos do país. Fora disto, vivia solitário, mas não era um misantropo, no meio dos seus livros, da sua direcção, a classificar e a dispor os exemplares, a escrever aos entomologistas da Europa, a redigir um catálogo descritivo dos seus tesouros. Esta a história do homem que eu viera consultar sobre o caso de Jim sem nenhuma esperança precisa, de resto. Viera unicamente para ouvir o que diria, e já era um alívio. Sentia-me inquieto, mas respeitava o interesse intenso, quase apaixonado, com que olhava para uma borboleta como se estivesse a ver mais para além do esplendor de bronze daquelas asas frágeis, dos desenhos brancos, das manchas sumptuosas, uma imagem de qualquer coisa de tão perecível e ao mesmo tempo tão indestrutível como aqueles tecidos delicados e sem vida que a morte deixara intactos.

«'Maravilhosa!', repetiu, levantando a cabeça na minha direcção 'Olhe para isto! Que beleza! Mas a beleza ainda não é nada: repare na precisão do desenho, na harmonia... Que fragilidade!... E, no entanto, que força.





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