Lord Jim - Cap. 26: Capítulo XXV Pág. 260 / 434

.. 'Mas o rajá tem um medo abominável de si. Toda a gente vê isso', argumentei com um certo azedume, confesso, sempre à espera da primeira convulsão de uma cólica diabólica: Estava terrivelmente agoniado. 'Se eu quiser fazer algum bem por estes sítio e conservar a minha posição', disse ele ao sentar-se a meu lado no barco, 'tenho de correr o risco: faço-o uma vez por mês, pelo menos. Muita gente espera que eu faça esse gesto... por eles. Tem medo de mim! É isso mesmo. O mais certo é ele ter medo de mim porque eu não tenho medo do seu café.' Mostrou-me então um sítio na fachada norte da paliçada onde as pontas aguçadas de algumas estacas estavam partidas. 'Foi por ali que saltei no terceiro dia da minha estada em Patusan. Ainda não substituíram as estacas. Um rico salto, não é verdade?' Daí a pouco passámos diante de uma enseada lamacenta. 'Foi aqui que dei o segundo salto. Corri um pouco para tomar balanço, mas não saltei suficientemente longe. Julguei que ia deixar aqui a pele! Perdi os sapatos ao debater-me. E durante todo o tempo pensei como seria odioso apanhar um golpe das suas malditas lanças atolado na lama. Lembro-me de como me sentia mal ao revolver-me no lodo, enjoado, como se tivesse mordiscado qualquer coisa de podre.'

«Eis o que se passou - e a oportunidade que Jim desejava corria ao lado dele, saltava sobre a brecha, patinhava na lama... e contudo conservava sempre o seu véu. A brusquidão da sua chegada inesperada foi a única coisa - compreende-me? - que o livrou de ser despachado a golpes de cris e atirado para o fundo do rio. Seguravam-no, mas era como se agarrassem uma aparição, um fantasma ou um espectro nefasto. Que significava? Que fazer dele? Seria demasiado tarde para aplacá-lo? Não seria melhor matarem-no sem mais demora? Mas então que aconteceria? O miserável e velho Allang quase ia enlouquecendo com a apreensão e a dificuldade de decidir.





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