Lord Jim - Cap. 30: Capítulo XXIX Pág. 294 / 434

Nas noites em que ficávamos acordados até tarde, a sua figura indistinta e silenciosa passava e tornava a passar sem ruído debaixo da varanda, ou então, ao levantar a cabeça, avistava-o de repente na sombra, de pé, direito e rígido. Regra geral, desaparecia algum tempo depois sem fazer barulho, mas quando nos levantávamos aparecia a nosso lado como se tivesse surgido do chão, pronto a receber qualquer ordem que Jim desejasse dar-lhe. Creio que a rapariga também não se ia deitar enquanto não nos separávamos para ir dormir. Mais de uma vez, através da janela do meu quarto, a vi sair calmamente com Jim para se apoiar na balaustrada tosca - duas formas brancas muito chegadas; Jim punha-lhe o braço à roda da cintura, ela apoiava a cabeça no ombro dele. Os seus murmúrios abafados chegavam até mim, penetrantes e ternos, com um tom calmo e triste no silêncio da noite, como um diálogo dito por uma só pessoa em dois tons diferentes. Mais tarde, quando me voltava na cama, debaixo do mosquiteiro, tinha a certeza de ouvir leves estalidos, uma respiração abafada, um tossir cauteloso - e sabia que Tamb' Itam ainda fazia a ronda. Embora possuísse (por favor especial do chefe branco) uma casa no recinto cercado, tivesse 'tomado mulher' e sido recentemente abençoado com um filho, creio que, pelo menos durante a minha estada, dormia na varanda todas as noites. Era muito difícil fazer falar este criado fiel e carrancudo. Até ao próprio Jim ele respondia com frases curtas e apressadas, de má vontade, por assim dizer. Parecia insinuar que falar não era da sua conta. A frase mais comprida que o ouvi dizer espontaneamente foi uma manhã, quando estendeu de repente a mão em direcção ao pátio para indicar Cornélio e disse: 'Lá vem o Nazareno.' Não creio que ele se dirigisse a mim, embora eu estivesse de pé a seu lado; o seu objectivo era antes despertar a atenção indignada do universo.




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