Foi então que, confessou-me Brown, sentado de costas para os companheiros, de olhos fitos em tudo aquilo, não obstante o seu desdém pelos homens e a fé inflexível em si mesmo, se sentiu invadido pela sensação de que acabara por ir bater com a cabeça contra um muro de pedra. Se naquela altura a chalupa estivesse a flutuar, teria tentado evadir-se, mesmo tendo de arrostar com uma longa perseguição no rio e com a fome no mar. É pouco provável que fosse bem sucedido, se tivesse tentado fugir. Não se arriscou. Instantes depois, passou-lhe pela cabeça a ideia de se lançar sobre a cidade, mas compreendeu muito bem que acabaria por se encontrar na rua iluminada, de cujas casas atirariam e os matariam como cães. Eram duzentos contra um, pensava, enquanto os seus homens, comprimidos à volta de dois montículos de tições, saboreavam as últimas bananas e assavam os poucos inhames conseguidos graças à diplomacia de Kassim. Sentado entre eles, Cornélio dormitava com um ar rabugento.
«De súbito, um dos brancos lembrou-se de que tinha ficado um pouco de tabaco na chalupa, e, encorajado pela impunidade do ilhéu das Salomão, disse que ia buscá-lo. Esta perspectiva fez despertar os outros do seu acabrunhamento. Brown, a quem pediam autorização, respondeu desdenhosamente: 'Vai, o resto é lá contigo.' Não via perigo algum em descer de noite até ao ribeiro. O homem transpôs um tronco de árvore e desapareceu. Instantes depois, ouviram-no trepar para a chalupa e tornar a sair. 'Já o tenho!', gritou. Seguiram-se um relâmpago e uma detonação, mesmo no sopé da colina. 'Estou ferido!', berrou o homem. 'Acudam-me! Acudam-me! Estou ferido!', e instantaneamente todas as espingardas começaram a disparar. A colina vomitava fogo e ruídos na noite, como um pequeno vulcão, e quando, à força de pragas e de socos, Brown e o ianque conseguiram fazer cessar o tiroteio provocado pelo pânico, um gemido profundo e doloroso elevou-se da margem e foi seguido de um queixume cuja lancinante tristeza era como que um veneno que enregelava o sangue nas veias.
